Finalmente, surgem detalhes da delação de Mauro Cid e a pergunta do delegado Fábio Shor que levou Braga Netto para a prisão

Gustavo Mendex


Uma mudança significativa nos depoimentos do tenente-coronel Mauro Cid foi um dos principais fatores que levaram à prisão do general Walter Braga Netto. A decisão foi tomada pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), após investigações da Polícia Federal (PF) apontarem contradições nos relatos de Cid sobre reuniões entre militares ocorridas após a eleição presidencial de 2022, vencida por Luiz Inácio Lula da Silva.


Os depoimentos de Mauro Cid, inicialmente considerados coerentes, passaram a ser questionados após investigações revelarem mensagens apagadas de seu celular e novos elementos surgirem em audiências posteriores. As reuniões em questão ocorreram em Brasília, sendo uma das principais no dia 12 de novembro de 2022, na casa de Braga Netto. Além de Mauro Cid e do ex-ministro, participaram do encontro o major Rafael Martins de Oliveira, das Forças Especiais do Exército, e o tenente-coronel Helio Ferreira Lima.


No primeiro depoimento, dado em 11 de março de 2024 na sede da Polícia Federal em Brasília, Mauro Cid descreveu o encontro na casa de Braga Netto como uma reunião em que foram discutidos temas gerais, como a conjuntura nacional, manifestações populares e pedidos de intervenção militar. Segundo ele, a reunião tinha um caráter informal, sem grandes definições, e ele próprio precisou sair mais cedo para retornar ao Palácio do Alvorada, onde Jair Bolsonaro residia.


A situação mudou quando, em 21 de novembro de 2024, Mauro Cid prestou novo depoimento, desta vez no Supremo Tribunal Federal. Nessa ocasião, ele trouxe um relato inédito sobre outra reunião que teria ocorrido dias após o encontro na casa de Braga Netto. Segundo Cid, o general entregou uma quantia em dinheiro dentro de uma sacola de vinho durante um encontro no Palácio do Planalto ou no Alvorada. O dinheiro teria sido repassado a pedido de intermediários para a realização de uma operação específica, e Braga Netto afirmou na época que os valores haviam sido obtidos com empresários do agronegócio.


Esse novo depoimento veio à tona depois que a Polícia Federal apresentou um relatório indicando supostas omissões no acordo de delação premiada firmado por Cid. A investigação descobriu mensagens apagadas em seu celular após a prisão de outros envolvidos no esquema, conhecidos como integrantes do grupo apelidado de “kids pretos”. O episódio levou o ministro Alexandre de Moraes a reafirmar a validade do acordo de colaboração premiada, mas reiterou que mentiras ou omissões poderiam resultar na anulação dos benefícios concedidos ao delator.


A situação ficou mais delicada para Cid no dia 5 de dezembro de 2024, quando ele foi novamente confrontado pela PF com documentos apreendidos. Durante essa nova oitiva, Cid revelou que, após ter sido solto inicialmente, ele e sua família foram abordados por pessoas próximas a Braga Netto. Segundo ele, seus pais passaram a ser procurados em uma tentativa de intermediários entenderem os detalhes da delação ou influenciar o que seria dito. Cid afirmou que evitava dar respostas diretas durante essas abordagens, desconversando para não revelar o conteúdo de sua colaboração premiada.


Essas informações se tornaram cruciais para o aprofundamento das investigações, uma vez que demonstraram contradições entre os primeiros relatos de Cid e os depoimentos mais recentes. A Polícia Federal considera que a nova versão dos fatos fornecida pelo tenente-coronel Mauro Cid indica o envolvimento direto de Braga Netto e outros intermediários em articulações que ocorreram após a vitória eleitoral de Lula. A menção a recursos financeiros e o suposto apoio de setores do agronegócio trouxeram uma nova dimensão ao caso, ampliando o escopo das apurações.


O episódio também acendeu um alerta sobre a validade de delações premiadas quando ocorrem omissões ou mudanças de versão. Em situações como essa, a legislação prevê que o acordo de colaboração pode ser revisto ou até mesmo anulado pelo Judiciário, dependendo da efetividade das informações fornecidas pelo delator. Alexandre de Moraes, ao validar a delação de Mauro Cid, destacou que o Judiciário terá a responsabilidade de avaliar o cumprimento do acordo no momento do julgamento.


A prisão de Braga Netto é vista como um desdobramento relevante na investigação que apura a atuação de militares e aliados próximos de Jair Bolsonaro após o resultado da eleição de 2022. O general, que foi candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro, passa a ser peça-chave na apuração de possíveis tentativas de interferência institucional ou articulações financeiras suspeitas no período pós-eleitoral.


Com as novas informações trazidas por Mauro Cid, o caso segue avançando nas mãos da Polícia Federal e do Supremo Tribunal Federal. O desfecho da investigação deve depender da análise de provas complementares e dos depoimentos de outros envolvidos, que agora estão sob maior escrutínio das autoridades. A prisão de Braga Netto representa mais um capítulo no cenário político e judicial brasileiro, marcado por investigações de grande impacto nos últimos anos.

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