Na última terça-feira, um juiz federal dos Estados Unidos decidiu suspender temporariamente uma ordem executiva assinada pelo ex-presidente Donald Trump que determinava a transferência de mulheres transgênero em prisões federais para unidades masculinas, além da suspensão de seus tratamentos hormonais. A decisão foi tomada pelo juiz distrital Royce Lamberth, em Washington, D.C., após um pedido de emergência apresentado por três detentas transgênero que preferiram manter suas identidades em sigilo.
O magistrado argumentou que a ordem de Trump poderia violar a Oitava Emenda da Constituição dos Estados Unidos, que proíbe punições cruéis e incomuns. Segundo ele, as detentas demonstraram uma alta probabilidade de sucesso no mérito da ação, justificando assim a suspensão temporária da medida. A decisão representa um revés para o ex-presidente, que desde seu retorno ao governo tem promovido uma série de ações voltadas a modificar políticas anteriores relacionadas a questões de identidade de gênero.
A ordem executiva assinada por Trump foi uma de suas primeiras iniciativas no novo mandato e foi apresentada como uma estratégia para "proteger as mulheres da ideologia de gênero". A medida, no entanto, gerou grande controvérsia e enfrentou forte resistência de ativistas e organizações de direitos humanos. Desde sua publicação, quase três dezenas de processos judiciais foram movidos contra a nova regulamentação.
Na semana anterior, um juiz federal de Boston já havia bloqueado a transferência de uma detenta transgênero com base nessa mesma ordem. No entanto, essa decisão afetava apenas aquele caso específico, enquanto a determinação do juiz Lamberth tem um alcance mais amplo e impede, de forma temporária, que a regra seja aplicada em todo o país.
O Departamento de Justiça dos Estados Unidos tentou argumentar contra a intervenção do Judiciário, alegando que as detentas ainda não haviam esgotado todos os recursos administrativos disponíveis e que as decisões sobre transferências prisionais não deveriam estar sujeitas à revisão judicial. O advogado do governo, John Robinson, defendeu que o Bureau of Prisons estava em processo de revisão das políticas para alinhá-las às novas diretrizes impostas por Trump. Robinson também afirmou que, até o momento, nenhum tratamento hormonal havia sido interrompido, classificando as alegações das detentas como prematuras.
Dados apresentados pelo governo indicam que existem atualmente 1.506 pessoas transgênero identificadas como do sexo masculino para feminino sob custódia do sistema prisional federal. No entanto, apenas 16 dessas detentas estão alocadas em unidades femininas.
O juiz Lamberth rejeitou os argumentos do governo, afirmando que o caso das detentas se enquadra em uma exceção rara que justifica uma intervenção judicial imediata. Ele destacou que a suspensão temporária da ordem de Trump teria pouco impacto no interesse público, mas, por outro lado, poderia evitar danos significativos às presas transgênero.
A advogada Jennifer Levi, que representa as detentas e atua na organização GLAD, especializada em direitos LGBTQ+, ressaltou que a transferência forçada para unidades masculinas poderia colocar suas clientes em risco extremo de violência e agressão sexual. Além disso, a suspensão dos tratamentos hormonais poderia causar impactos severos à saúde das presas.
De acordo com os relatos das detentas, após a assinatura da ordem executiva, elas foram imediatamente removidas da população carcerária geral e transferidas para unidades segregadas. Essa mudança gerou grande temor de que fossem enviadas em breve para prisões masculinas, onde poderiam perder o acesso aos tratamentos médicos adequados e ficariam expostas a um ambiente hostil.
Levi enfatizou que a medida proposta por Trump se baseia em uma negação da existência de pessoas transgênero e ignora completamente as necessidades e os direitos dessas detentas. Ela afirmou que suas clientes estão aterrorizadas com a possibilidade de transferência e que a decisão do juiz Lamberth representa um alívio temporário diante da ameaça que enfrentam.
A suspensão da ordem não significa uma decisão definitiva sobre o caso. O governo ainda pode recorrer da medida, e o caso continuará tramitando nos tribunais. A batalha jurídica em torno dos direitos das pessoas transgênero no sistema prisional dos Estados Unidos promete ser longa, com implicações que vão além das prisões e podem influenciar o debate sobre políticas públicas voltadas à população transgênero no país.
Nos bastidores políticos, a decisão do juiz foi vista como uma das primeiras derrotas do governo Trump em sua tentativa de reverter políticas implementadas durante administrações anteriores, especialmente aquelas relacionadas a direitos LGBTQ+. O ex-presidente já havia declarado publicamente que pretendia adotar uma postura mais rígida em relação a questões de identidade de gênero, argumentando que tais políticas comprometem a segurança e os direitos das mulheres cisgênero.
A expectativa agora é de que grupos conservadores e aliados do ex-presidente intensifiquem os esforços para garantir a implementação da ordem executiva, enquanto organizações de direitos humanos continuarão a lutar para impedir que a medida seja colocada em prática. O resultado desse embate poderá definir o futuro das políticas de encarceramento de pessoas transgênero nos Estados Unidos e influenciar debates semelhantes em outros países.