Ninguém é responsável pelo desastre?

Gustavo Mendex


 tribunais, com verbas vultosas sendo liberadas para magistrados e desembargadores em um cenário econômico onde a conta não fecha para a maioria dos brasileiros. O Judiciário, embora negue veementemente sua responsabilidade, é alvo de críticas constantes por sua suposta contribuição para a crise fiscal do país. E, enquanto as manchetes se acumulam, a população assiste perplexa a um ciclo que parece não ter fim.


O fato é que, em 2024, o Brasil caminha em uma corda bamba financeira. As dívidas públicas, já insustentáveis, alcançaram a marca de 1 trilhão, uma cifra tão absurda que parece difícil de ser compreendida pela população comum. Enquanto isso, o governo e seus defensores apontam as reformas como a única solução possível. No entanto, as articulações políticas para aprovar tais reformas dependem, invariavelmente, de barganhas como a liberação de emendas parlamentares, perpetuando um sistema de governança que privilegia interesses individuais e deixa de lado as reais necessidades do país.


Por outro lado, o Judiciário, representado pelo Supremo Tribunal Federal e liderado por Luís Roberto Barroso, se isenta de qualquer responsabilidade sobre o colapso fiscal. Segundo Barroso, os juízes possuem direito a indenizações e retroativos, valores que frequentemente superam os tetos salariais estabelecidos pela Constituição. Argumenta-se que a remuneração deve ser compatível com a responsabilidade da função e atrativa o suficiente para competir com outros cargos do setor jurídico. Mas a realidade é que o pagamento de supersalários e a liberação de bilhões em retroativos contrastam drasticamente com o discurso de austeridade exigido à sociedade.


A crise fiscal brasileira, portanto, não tem um único culpado. O Executivo aponta o dedo para o Legislativo, que, por sua vez, condiciona apoio a contrapartidas financeiras. O Judiciário, por fim, nega qualquer envolvimento, apesar das cifras astronômicas liberadas para a magistratura. A pergunta que paira é: de quem é a responsabilidade por este cenário? Alguém há de ser culpado pelo endividamento sem controle de um país rico em recursos, mas pobre em gestão e responsabilidade.


Enquanto os responsáveis se isentam, o povo paga a conta. A carga tributária aumenta, o poder de compra diminui e o desemprego se mantém em patamares preocupantes. A desigualdade social cresce à medida que as classes mais altas, blindadas por privilégios e decisões jurídicas convenientes, seguem acumulando vantagens. Os trabalhadores, no entanto, continuam a viver com salários defasados, benefícios reduzidos e serviços públicos cada vez mais precários.


É impossível não enxergar o reflexo de uma democracia distorcida, onde aqueles que deveriam servir à população se colocam acima dela. A fala de Barroso, ao afirmar que o Judiciário não é responsável pela crise fiscal, soa como uma negação descolada da realidade, principalmente quando os números revelam o contrário. O problema não está apenas nos retroativos liberados ou nos supersalários pagos, mas em um sistema onde o dinheiro público é tratado como recurso infinito, ao passo que as necessidades básicas do cidadão são relegadas a segundo plano.


A metáfora de Humpty Dumpty, de Lewis Carroll, citada em meio às discussões, traduz bem a situação: no Brasil, o poder de quem manda é mais importante do que as palavras escritas ou as promessas feitas. A interpretação das regras – ou das leis – é maleável conforme o interesse dos poderosos. E, nessa dança, o cidadão comum é aquele que sempre perde.


A verdade é que a dívida de 1 trilhão não surgiu do acaso. É fruto de décadas de má gestão, de um sistema político que prioriza alianças financeiras e de um Judiciário que, em muitos momentos, ignora a realidade econômica do país. Enquanto os líderes dos três poderes se eximem de culpa, a Terra dos Papagaios segue quebrada, carregando uma conta que ninguém parece disposto a pagar, mas que, ao fim, sempre recai sobre os ombros do povo.


Resta a pergunta que muitos evitam fazer: até quando? Enquanto não houver responsabilização, transparência e compromisso com os interesses da nação, o Brasil continuará preso em um ciclo de crise e endividamento. Alguém precisa ser responsabilizado, mas, por ora, todos parecem ocupar a confortável posição de inocência, deixando a população à mercê de um sistema falido.
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